No Tranco do Mutim
Vou sacudindo a ossamenta no balanço do Mutim
Num rancho, chão de cupim, nesse rincão missioneiro
E a fumaça do candieiro vai adentrando na venta
E a cordeona se sustenta abrindo e fechando o fole
Sonidos que a noite engole sob a Lua sonolenta
Don Adalberto abre a gaita como um sagrado responso
Vem do rincão mais esconso riscado de japecanga
O meu canto se arremanga lavando a alma num verso
Mundo xucro, céu disperso que se enreda na emoção
Na harmoniosa comunhão dentro do meu universo
Ilheira e baixo conversam no mesmo vocabulário
Configurando o sacrário do missal do rancherio
Um lampião treme o pavio do vento que vem da porta
Na imagem que se recorta de quem baila e se sacode
Entra e se sai como pode porque o resto pouco importa
Entra e se sai como pode porque o resto pouco importa
Se eleva o pó na bailanta, se agoa e segue de novo
É costume do meu povo o baile, dança, entreveiro
Gaita, violão e pandeiro que diverte e acostuma
Sem diferença nenhuma do sarau mais requintado
Nesse ronco abarbarado que a alma inteira perfuma
O rancho se enche de luz, vaneira de pontesuela
Da gaita, escapa uma estrela alumiando todo o rincão
O céu vem morar no chão em celeste forma divina
Que enternece, que ilumina como deusa e o paraíso
Transparecido em um sorriso nos lábios de alguma china
Uma cordeona se abrindo, de campo inteira, se veste
Capão de mato celeste, segredo puro do embalo
É como um canto do galo na minha querência reiuna
Nem o vivaz mais turuna não sabe a importância exata
A gaita, mais que ouro e prata, na terra é a maior fortuna
A gaita, mais que ouro e prata, na terra é a maior fortuna