Liberta
Eu tenho me encontrado em cada batida
Tenho me aceitado em cada linha escrita
Tenho me perdoado em cada rima lírica
O ódio e o amor falam no meu ouvido todo dia
Essa é a dualidade que eu conheci nos livros
Gregório de matos tem feito mais sentido
Brasileira mas não como manda o roteiro
É o rótulo que eu mais me orgulho e que eu mais odeio
Fico pensando se o que sair do meu ventre vai ter que viver o que eu vivi
Se um dia vai ter que ver as coisas que eu vi
Isso desanima mas não faz desistir
Mas se eu for metade da mãe que eu tive vale a pena insistir
É transformar as coisas pequenas em gigantes
Agradecer por respirar mais um instante
Se afastar um pouco do sangue e das lágrimas
E entender que o passado nunca mais vai voltar
Eu queria que voltasse mas não pelos meus erros
Queria que aquele homem olhasse pra mim e não tivesse tido desejo
Eu era apenas uma criança sorrindo
Os anos se passaram e isso se repetiu enquanto eu tava dormindo
Anos depois foi mais agressão e treta
A cada dia é mais difícil ser uma mulher preta
Quando criança eu aprendia mas não entendia
Que meu corpo só é apreciado na roda de samba com uma cervejinha
O meu erro foi ter ido onde eu não devia
Foi ter abraçado as ideia que eu não devia
Foi ter defendido quem eu não devia
Isso eu descobri quando tava chorando no quarto sozinha
Eu falo sobre choro, você ouve como se fosse fraqueza
Se eu fosse fraca eu tava fria em cima de uma mesa
Meu choro é fortaleza
Meu choro é água fervendo no seu mar de frieza
Mais um relato testemunhado pelo microfone
Ele que me dá voz e me esconde
É o peito de aço que eu queria tanto ter
É o único olho que realmente consegue me ver
Consegue me entender e me escutar
A minha verdade pra você ele que vai liberar
A minha liberdade hoje que vai cantar
As minhas correntes o mic que vai destrancar
Mais uma poeta pedindo socorro rimando
Eu só vou me salvar
Quando eu salvar quem tá me escutando