Místico Fidedigno
Todo dia eu tenho o mesmo sonho
Lindo, simétrico e complexo,
Acordo em febre, e choro até não me lembrar,
Pois as manhãs que vêm a mim
Me dão à impressão de que tudo isso
É apenas mais um déjà vu em que vivo
Tanto já perdi, não tenho mais o que preciso,
Estou ferido, mas o motivo disso
Não consigo me lembrar,
E talvez seja melhor nem lembrar
Pois as marcas são as provas
Da frieza, da dureza a que fui arremetido
Sinto tanto frio
Que encolhido nos encontros
Das paredes de concreto eu me esquento
Como se fossem sedas de lençóis
Como se um corpo que eu conheço bem
Mas não me lembro quem
Esteve comigo
Em meio a lágrimas e soluços
O silêncio vem me conjugar
Premeditando que depois do fim
Sempre haverá uma recomeço
Mas sou tão incrédulo que não consigo acreditar
Pois os meus pulmões são meus pontos frágeis agora
E sinto uma intensa dor na coluna cervical e dorsal
No momento em que respiro
Tenho pouco tempo
E o tempo que tenho é menor do que preciso
Por isso não venha me roubar
Quando eu estiver distraído
Mentido pra mim sobre o que sinto
Diagnosticando o que esqueço
Diferenciando o mais do mesmo
Não é insensatez
Mas nos vaivens da existência
Volto a experimentar
Um trago, uma dose, um comprimido
Pois é o que eu encontro pra preencher todo o vazio
De tudo que olho, toco e não sinto,
Isso não é vício, ponto de fuga, nem abrigo
É o próprio descontrole tentando se controlar
Procurando uma alternativa
Que me mantenha em pé
Mesmo que sem forças, ainda vivo.
Meu sentimento é como o vento
Tudo toca, em tudo está,
Mas em nada permanece,
Entretanto não deixa de se movimentar
E de mover tudo que está a sua volta
Mesmo que não tenha mais sentido
Não é só o cisma de um signo zodiacal
É sagitário em metal regente de estanho
Meu perfume é sândalo-jasmim
Minhas pedras: quartzo rosa, safira e turquesa
Meu número de dita é dois antes do três
A fatalidade é da quarta pra quinta-feira
Em azul, rosa, amarelo, púrpura e violeta
E se isso for destino não sei
Não me lembro
E talvez seja melhor nem lembrar
Pois as marcas são as provas
De que já vivi, já senti
A carne ainda sabe de cor
Mas a alma não gostou das marcas
Talvez seja por isso que não me lembro...