Numa Secular Noite
Numa secular noite
Numa dessas muitas noites perdidas das neblinadas do tempo
Chegava eu vindo da África
Em terras da Bahia
Ao pisar na terra da soberania do dendê
Que nessa época era terras da soberania
Da mandioca e de todos os pajés
Uma chicotada de despedida do meu algoz
Que castigavam-nos com um olhar
E com um chicote durante toda a travessia
Fez-me sussurrar para mim
Com uma posse de liberdade tão grande
Que meu grito ecoou
Do longínquo 1532 até o 2 de Julho de 1823
E todos de todos os tempos
Em todo o retorno e o contorno da Bahia de Todos os Santos
E na própria Bahia
Ouviu o desabafo glorioso do eu chicoteado
Quem és tu por ventura
Que ousa chicotear um ungido de gun, Ogum?
Enteado de Sogbô, Xangô
Neto de Obaluayê, Omolú Azamssum
Filho de Aziri Thobossi
Oxum e todos os Erês
Um amamentado de Nanã
E filho de leite de Iemanjá
Nascido livre
E apenas por um tempo
Dentro da ignominia de alguns
Supostamente acorrentado
Todavia, totalmente livre como o som que sonoriza a vida