Gangorra

Tá tudo ao contrário
A vida olha pra mim e deve achar que eu sou um otário
Ou um vigarista ordinário pra ter que viver aqui
E você também, nós tá no mesmo barco

Sou mais um sobrevivente desse naufrágio
Vítima da geração de um ego tão frágil
Tudo é tão ágil
Todo mundo aponta o dedo porque o julgamento volta
Isso é um refúgio
Todo mundo luta pra ser feliz, original
Se você também sorri é plágio
Liberdade é teoria e não prática
Senão rodovia não teria pedágio

Filho da desiguldade no trópico
Questionar o mundo é o meu tópico
Achar alguma resposta é utópico
Igualdade por aqui é um termo impróprio

Coitado, ele não sabe que mérito
É um clássico prótotipo
Típico de um discurso distópico
Pra trazer desigualdades do próximo
Através da ideia de que todo mundo pode
Mmas isso é óbivo, é lindo, é ótimo
Mas na prática dinheiro é só um sonho erótico
Salário mínimo é um analgésico
Rede social é um narcótico
Psicótico, traz alucinação
De que todo mundo tá bem próspero
Só você que tá na merda
Seu fracasso é tão exótico
Teu mindset que é caótico

Afinal o capitalismo é ótimo
Todo mundo tem a mesma chance
Se você não conseguiu a culpa é sua que não se matou de trabalhar
Porra, mas isso é lógico
Não tem a ver com onde tu nasceu, onde tu estudou
Quanta grana tua família tem e o quão bom era teu professor
Só tem a ver com o quanto você se esforçou
Não tem a ver com ser homem ou mulher
Branco ou preto, imagina, só tem a ver com a tua disciplina

A fala de mérito é fachada
Eu dei risada quando o whindersson falou isso no Twitter
Porque só podia ser piada
De mau gosto, óbvio
Porque não foi engraçado, só perpetuou desigualdade
Todo mundo pode ser rico, isso é verdade
Basta ganhar na loteria ou virar politico na desonestidade
Ou ter a sorte de um em um milhão e fazer arte e virar celeberidade
Ou ser herdeiro de um império da antiguidade
Capitania de um povo escravizado na maldade
Ou então passar na faculdade, trabalhar até a terceira idade
Morrer na classe média baixa e achar que você venceu nessa sociedade

Mais um aluno entrou na escola com uma faca, uma arma
Fez um atentado e tirou mais uma vida
Vamo fingir que isso foi mais um caso à parte
E não o espelho de uma geração adoecida
Esquecida, onde o celular que ilumina a ferida
Onde a comparação é a droga preferida
Automutilação virou um esporte sem torcida
E eu quero ouvir um viva, um viva, um viva

A gente finge que não vê então tá tudo bem
Sempre tá tudo bem
Mais um que matou o outro, tudo bem
Se matou, tudo bem
Se cortou, tudo bem
O que chorou, tudo bem
Tudo bem pra quem?

Eu queria ser um mágico
Sim salabim pra por um fim
Nesse final tão trágico
Mas infelizmente eu sou um músico
Lúcido, cómico, ilustre, inapto

Se eu não te conheco dou um beijo
Se você morar na minha casa toma tapa
Tá tudo invertido, saca?
A gente tá afiando o queijo e tá comendo a faca
Tá comendo o tempo que não volta
Vida pacata, eu fico puto quando vocês me idolatram
Porque eu não sou um gênio, eu sou um babaca
Levei duas decadas pra entender que a grana mata
Que a comparação mata, que autoestima é ouro
Dinheiro é mato e amor ainda é prata
No fundo nós não passa de primata
Que grita e ataca
Pra ficar no galho mais alto dessa mata
Porra, que lixo, que zona, que várzea, que zorra

Eu não quero subir se for pra tu descer
A vida é um pula-pula e não gangorra

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